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Mãe de UTI

Mãe de UTI

Pé de bebê com aparelho no hospital
Há dois dias eu estava mais uma vez no pronto-socorro do hospital com meu filho Renan e é sempre inevitável pensar nas mães que estão lá no andar da UTI com seus amores enquanto estou entre aquelas paredes. Chamo-as carinhosamente de mães de UTI.

Estive lá pelo menos sete vezes nos últimos dez anos e em cada uma delas pude viver todo tipo de emoção e conhecer algumas histórias que jamais esquecerei.

Tem mãe de UTI que mora lá. Literalmente.

Tem mãe de UTI que já sabe que seu filho não voltará para casa.

Tem mãe de UTI que vai para casa sabendo que voltará logo.

Tem mãe de UTI que sabe que vai ficar tudo bem.

Tem mãe de UTI que nem viu o filho que acabou de nascer.

Tem mãe de UTI que nunca esteve lá antes.

Tem mãe de UTI que nunca saiu de lá.

Tem mãe de UTI que chora. Chora muito.

Tem mãe de UTI que segura o choro porque tem vizinhos demais.

Tem mãe de UTI que sorri aliviada.

Tem mãe de UTI que tem uma UTI em casa.

Tem mãe de UTI que já não consegue rezar.

Tem mãe de UTI que tem terço entre os dedos.

Tem mãe de UTI que não consegue ficar lá.

Tem mãe de UTI que fica e não dorme, vigilante.

Tem mãe de UTI apavorada.

Tem mãe de UTI acostumada.

Tem mãe de UTI que uma anestesia de dentista levou sua filhinha para sempre.

Tem mãe de UTI que um tombo na escola levou seu filho valente.

Tem mãe de UTI que deu a luz enquanto seu outro filho partiu doente.

São tantas dores

Quando eu olhei nos olhos de cada mãe que conheci foi unânime: Deus estava lá, em cada um deles.

Deus estava ao lado delas enquanto passavam pelos corredores, enquanto comiam, enquanto só ouviam notícias difíceis, enquanto me contavam suas lutas.

Até o fim de cada história. Porque é inexplicável não padecer.

O caminhar é flutuante. O olhar parece ter a pupila dilatada. As palavras parecem ser ditas por outro.

Porque não são elas. É Deus.

Uma fagulha permitida da dor, seria padecimento automático. E não. A fagulha é de sustento invisível, inacreditável.

Em todas as minhas orações peço pelas mães de UTI e suas crianças. E me emociono. Porque em fração de segundos me transporto e consigo sentir o que cada uma está sentindo.

Em todas as minhas orações agradeço por estar em casa mais um dia e mais uma noite, mesmo sabendo que sou uma mãe de UTI.

Ludmila Barros - 🔗@ludmilapb

Comentários

Márcia Margalhães disse…
Eu tô aqui na UTI, emocionada com o seu texto, porque é exatamente isso!!! Hoje é meu dia 11 de internação com meu filho e, nesse momento, sou a mãe vigilante, que não dorme! Rs bjo amiga, adorei!
Ludmila Barros disse…
Ah amiga... maravilhosa você! Sigamos firmes!

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